Por Pr. Paulo Brasil
Is.
59:16-17
“Viu que não havia ajudador algum e maravilhou-se de que não houvesse um
intercessor; pelo que o seu próprio braço lhe trouxe a salvação, e a sua
própria justiça o susteve. Vestiu-se de justiça, como de uma couraça, e pôs o
capacete da salvação na cabeça; pôs sobre si a vestidura da vingança e se
cobriu de zelo, como de um manto”.
Por que somente Cristo e não outro pode trazer a
salvação à humanidade?
Temos visto, na nossa modernidade, e na nossa
teologia contemporânea, uma grande mudança no evangelho quando se fala de
salvação. Muitos apresentam Cristo como Salvador, mas muitos que dizem vir a
Cristo, não têm a consciência clara do pecado; do horror do pecado; do nojo do
pecado. Por isso vêm a Cristo sem muita convicção do que na verdade são. Alguns
vêm a Cristo alegremente e com sorriso nos lábios, sem a mínima consciência do
pecado que as escravizam. Isso parece não ser culpa apenas destes que assim
vêm, mas também daquele que expõe este novo evangelho que não é bíblico. Quando
entendemos que o evangelho é de graça, percebemos que não é verdadeira aquela
idéia de que o mesmo tem pouco valor, mas é de graça porque não posso nunca,
com minhas próprias forças, pagar algo em troca da minha salvação. A diferença
é radical. Essa idéia de que é fácil ser salvo e por isso tem pouco valor, vem
do contexto moderno capitalista, equivocado, de que o que é de graça, no mínimo
nos faz ficar desconfiado de que não vale muito; mas o evangelho, ao contrário,
é de graça, exatamente porque vale muito, vale tanto, visto que nada podemos
fazer para pagar por ele.
Daí se vê a impossibilidade de alguém vir a Cristo
sem primeiramente se humilhar, quebrantar o coração, colocar a boca no pó,
entender que é um verme diante da santidade augusta de Deus e que precisa
desesperadamente dEle. Foi assim o caminho de todos os homens que provaram a
salvação: quebrantamento, convicção de pecado e de miséria. Porque quando
conheceram a verdade da salvação entenderam que não eram nada e necessitavam da
misericórdia de Deus.
Usamos este texto do VT porque há muita
dificuldade na igreja de hoje de se pregar sobre o textos do VT como se fosse
um peso histórico sobre as costas da Igreja e que ela precisa carregar. O VT,
assim como o NT, é permeado de graça. Depois da queda, ninguém foi salvo por
obediência à Lei, mas pela graça de Deus. Dessa forma, se percebe que no VT,
também a graça é evidente, tanto é que aqui no VT, neste texto, está sendo
exposta uma doutrina que vai ser refletida por Paulo e pelo próprio Senhor
Jesus Cristo.
Neste texto de Isaías já podemos ter a compreensão
desta obra eficaz de Cristo. No versículo anterior, (v. 15) podemos ler: “Sim, a verdade sumiu, e quem se desvia do mal é tratado como presa. O
SENHOR viu isso e desaprovou o não haver justiça. Viu que não havia ajudador
algum e maravilhou-se de que não houvesse um intercessor (v.16)”. Por que será que Deus se
maravilhou de não haver um intercessor? Quem será a figura deste intercessor?
Por acaso não haveria alguém que tivesse piedade, em Israel, que orasse a Deus,
que buscasse a Deus; ninguém que fosse um intercessor? Por que Deus afirma que
não havia um só intercessor? Porque nos termos da intercessão a que Ele se
referia e exigia, somente alguém especial e que fosse perfeito poderia exercer
e executar esta função.
Em Isaías 53.6
lemos:
“Todos nós andávamos desgarrados como
ovelhas; cada um se desviava pelo caminho, mas o SENHOR
fez cair sobre ele a iniqüidade de
nós todos”.
Sem dúvida vemos
aqui um texto que está se referindo a Cristo: “Andávamos desgarrados como ovelhas;... mas O Senhor fez cair sobre
ele...”. “Ele” quem? Jesus
Cristo! A iniquidade de quem? De todos nós! O que isto tem a ver com
intercessão? Em português não podemos ter a noção correta. A palavra “intercessor” em Is 59:16, tem a mesma
raiz da palavra usada aqui para a expressão “fez cair” (Is 53:6). Na verdade é a mesma palavra. A iniquidade de
todos nós caiu sobre Ele; Deus “fez cair”,
fez convergir sobre Jesus. A palavra “intercessão”
é a mesma palavra para a expressão “fez
cair sobre ele”. Por que Ele não encontrou intercessor? Temos que ir para
Is. 53:12 – “...contudo levou sobre si o
pecado de muitos, e pelos transgressores intercedeu”.
Em Is. 59:16-17, percebemos que o intercessor só
poderia ser alguém que fosse perfeito e que levasse sobre si a culpa dos
transgressores. Que relação existe entre o “fazer cair”e a “intercessão”? Por
que Deus, mesmo inspirando a Isaías, não o fez escrever a palavra “intercessão”
no v. 6 e não o fez escrever a expressão “fazer cair” no v. 12?
É simples. O próprio Jesus nos explica em João,
quando faz a oração sacerdotal (cap. 17). “É
por eles que eu rogo; não rogo pelo mundo, mas por aqueles que me deste, porque
são teus” (João 17:9). Eu rogo por aqueles por quem realizei a expiação: Os
que Tu me deste! Agora fica claro o porque a intercessão é uma obra posterior à
própria expiação. O único que poderia interceder por nós era aquele que tivesse
as condições de “levar sobre si” a
nossa iniqüidade. O intercessor que não tivesse esta condição de levar sobre si
nosso pecado, não seria um intercessor aceitável por Deus. “...maravilhou-se de que não houvesse um
intercessor...”. Por isso, no v. 6 de Is 53 lemos: “...o Senhor fez cair sobre ele...”. Todas as iniqüidades foram lançadas
sobre Cristo e depois que tudo veio sobre Ele, então intercede por todos os
transgressores eleitos. Foi pelos eleitos, tanto é que Jesus afirma na sua
oração que não roga pelo mundo mas por aqueles que o Pai lhe dera (Jo 17:9).
Ele intercede por aqueles pelos quais morreu.
Por isso é impossível haver salvação fora de
Cristo. Porque, para que o homem se apresente diante de Deus ele terá de ser
representado, de ter um representante. Muitas vezes negamos a Cristo e queremos
ser nossos próprios representantes; nós mesmos nos representamos dizendo: as
minhas obras podem me trazer salvação. Mas se nos achegarmos diante de Deus com
o que fazemos, seremos destruídos, porque Ele é justiça santa.
Ao entender isso, podemos mostrar o “lado
negativo” no que diz respeito à impotência humana e a aplicabilidade desta
verdade à vida do homem pecador.
Se olharmos para Is. 59 percebemos que os
versículos 16-17 praticamente estão concluindo o capítulo. Este capítulo é
excelente para se expor porque é um texto progressivo, onde as idéias são
progressivas; vemos que as idéias vão surgindo no texto com naturalidade. Por
isso começamos quase pelo fim, porque agora podemos mostrar a perfeição da obra
de Cristo e a impossibilidade das nossas próprias obras nos salvarem. Assim
entenderemos porque só Ele é SUFICIENTE para a nossa salvação.
Primeiramente, no início do capítulo, Isaías diz
que o pecado traz separação entre os homens e Deus (v. 2). Muitos acham que
pessoas que estão doentes ou com problemas, têm tudo isso como um sinal de que
Deus as desamparou, ou que estão em pecado ou coisas dessa natureza. A Bíblia
nunca diz isso, pelo contrário, se lermos Romanos 8, veremos o oposto disso,
quando o apóstolo Paulo diz que: “Porque eu estou bem certo de que nem
a morte, nem a vida, nem os anjos, nem os principados, nem as coisas do
presente, nem do porvir, nem os poderes, nem a altura, nem a profundidade, nem
qualquer outra criatura poderá separar-nos do amor de Deus, que está em Cristo
Jesus, nosso Senhor”
(Romanos 8:38-39). Essas coisas não nos separam de Deus, mas o pecado sim. Este
nos separa de Deus.
Mas que pecado é
este? É verdade que todo pecado nos separa de Deus, em certo sentido, mas o
pecado ao qual nos referimos aqui é o pecado daqueles que ainda não foram
justificados por Cristo. Esse pecado com certeza separa o homem de Deus. Ela
pode até receber benefícios, bênçãos materiais, sem que tenha compromisso algum
com Deus. Não é por receber bênçãos de Deus que o homem é de fato seu servo.
Uma coisa é Deus fazer o que o homem precisa, a outra, é o homem fazer o que
Deus pede. Só fazem a vontade de Deus aqueles que Lhe pertencem. O fato de
pessoas incrédulas receberem benefícios de Deus é explicado pela doutrina
reformada da chamada “graça comum” que está estabelecida no mundo. Não só traz
bênçãos, mas refreia o mal no mundo. O sol nasce sobre maus e bons, a chuva cai
sobre justos e injustos. Não há como negarmos o fato de pessoas que negam a
Deus possam ser saudáveis, bem de vida financeiramente, às vezes, mais do que
aquelas que Lhe servem. Pois este não é o parâmetro da salvação.
Mas os que foram
purificados de todo pecado, estes estão unidos de maneira indissolúvel com Ele.
E até os pecados que são cometidos após esta união são perdoados quando
confessados a Deus e a volta à alegria da salvação é restabelecida. Essa
separação de Deus do homem é causada pelo pecado que causa um abismo. Só que
este pecado tornou-se imenso, gigantesco, pelo fato de ser Deus tremendamente
santo e nós miseráveis pecadores. O pecado formou um abismo gigantesco de
separação, porque Deus é santíssimo e não pode aceitar o pecado, não pode
compactuar com aqueles que o praticam. Mas o homem que estava dentro deste
abismo tentou algumas formas criativas com o propósito de voltar-se para Deus,
buscou trilhar caminhos de volta para Deus e Deus rejeitou. Dessa forma
entendemos o porque Isaías diz no cap. 59:16 que Deus “...maravilhou-se
de que não houvesse um intercessor...”.
É como se Deus estivesse contemplando os homens
como lhe é peculiar, e visse os homens fazendo alguma coisa que achavam poderia
ser boa o suficiente para aproximá-los dEle, mas jamais conseguindo.
No versículo 3 e 4 lemos: “Porque as vossas mãos
estão contaminadas de sangue, e os vossos dedos, de iniqüidade; os vossos
lábios falam mentiras, e a vossa língua profere maldade. Ninguém há que clame
pela justiça, ninguém que compareça em juízo pela verdade; confiam no que é
nulo e andam falando mentiras; concebem o mal e dão à luz a iniqüidade” (Isaías 59:3-4). As mãos e os dedos
estão contaminados. A mão que serve para realizar coisas, para o trabalho, para
realização de obras, se estiver contaminada de iniqüidade não pode realizar
alguma coisa agradável a Deus. É impureza! Isso mesmo Isaías diz no capítulo
64:6 – “Mas todos nós somos como o
imundo, e todas as nossas justiças como trapo da imundícia”. O texto não
diz que são as nossas injustiças, nossos pecados, que são trapo da imundícia
mas as nossas obras de justiça. Por que? A resposta está em Isaías 59 quando
ele diz que as mãos estão contaminadas pelo pecado e tudo que se fizer com
estas mãos, para conseguir salvação, levará, ao contrário, para a condenação. O
homem está contaminado.
Voltando para o
cap. 59:6, De forma explícita vemos isso nas palavras de Isaías em 59:6 – “As suas teias não se prestam para vestes, os
homens não poderão cobrir-se com o que eles fazem, as obras deles são obras de
iniqüidade, obra de violência há nas suas mãos”. Eles não podem cobrir-se
com o que fazem. É como alguém que deita em uma cama de criança e lhe é dada
uma coberta de criança. Ou os pés ficam cobertos mas a cabeça descoberta, ou a
cabeça coberta e os pés descobertos. É isto o que o texto está dizendo. O que
nós fazemos com nossas mãos não serve para vestir-nos, para cobrir-nos. Quando
achamos que somos salvos por nossas obras, estamos deitando em uma cama de
criança e nos cobrindo com um lençol de criança – não serve para vestir, “não se prestam para vestes, os homens não
poderão cobrir-se com o que eles fazem, as obras deles são obras de iniqüidade”.
Não podemos nos cobrir, não podemos nos proteger com nossas obras. É impossível
para um homem cobrir-se com aquilo que faz. Esta é a característica de um homem
que tenta se salvar com aquilo que faz, com seus esforços próprios, com suas
obras de justiça, com sua justiça própria. Este não consegue se cobrir.
A Palavra diz
que estas pessoas “Desconhecem o caminho
da paz, nem há justiça nos seus passos;
fizeram para si veredas tortuosas; quem andar por elas não conhece a
paz. Por isso está longe o juízo e a justiça não nos alcança; esperamos pela
luz, e eis que há só trevas; pelo resplendor, mas andamos na escuridão”
(59:8-9). Literalmente “veredas tortuosas”
significa “caminhos de pedra”; ou seja, um atalho. Os homens tentam fazer
atalhos e quem anda por esses atalhos não conhece a paz. Que caminho é esse?
Que atalho é esse? O de suas próprias obras. A salvação tornou-se impossível ao
homem pelo que ele é ou pelo que ele faz.
Por isso Deus
olha e diz: “Não há um intercessor suficiente!” E diz o texto que Ele mesmo,
com “seu próprio braço lhe trouxe a
salvação e a sua própria justiça o susteve” (v. 16). Foi Deus que com Seu
braço forte nos trouxe a salvação e com Sua própria justiça nos susteve. Isso
fica claro agora. Por que Deus teve de nos trazer a salvação? Por que o homem
não é suficiente em si mesmo, ele precisa da obra do próprio Deus. Trilharam
caminhos para si mesmos, mas Deus disse que estes caminhos conduzem à morte. O
caminho é o que Deus mesmo traçou.
No v. 17 vemos
um verbo muito interessante: “vestir”. “Vestiu-se
de justiça”. Este verbo é literalmente a mesma palavra usada no v. 6: “As suas teias não se prestam para vestes...”. Em outras palavras,
Deus mesmo teve de se vestir, porque as vestimentas que os homens fazem não
servem para vesti-los. Por isso Ele mesmo teve de se vestir para poder trazer a
salvação aos homens. Diz a Palavra no v. 17 que Ele “vestiu-se de justiça, como de uma couraça, e pôs o capacete da salvação
na cabeça; pôs sobre si a vestidura da vingança, e se cobriu de zelo como de um
manto”. Paulo em Efésios 6 quando fala do combate do cristão, está se
lembrando deste texto, estava se lembrando da grandeza do próprio Deus que se
vestiu com a couraça da justiça, que colocou o capacete da salvação e que tomou
sobre si a vestidura da ira de Deus e se cobriu do zelo do Senhor. Paulo estava
se referindo à obra do próprio Deus que veio trazer salvação aos homens
perdidos e inabilitados para realizar Sua própria salvação.
Agora afirmamos
que nós só poderemos ser salvos pela suficiência de Cristo, da Sua obra mais
que suficiente. Ninguém encontrará a verdadeira salvação se não encontrar o
verdadeiro Salvador: Jesus Cristo vestido de justiça – obra da Sua humilhação.
Sobre Ele caiu a justiça de Deus e Ele nos cobriu com Sua justiça e nos tirou
da situação vergonhosa de despidos de justiça – obra de humilhação.
Devemos nos
apresentar diante de Deus dizendo: “Não tenho nada para te oferecer, tem
piedade de mim miserável pecador. Ho, Senhor, Tu que estás vestido de majestade
e glória, que és poderoso para resgatar-me das trevas, dá-me Tua salvação”.
Despidos de toda vaidade, soberba, presunção e justiça própria, nos
apresentaremos a Ele dizendo: “Eu dependo da Tua justiça; quero ser salvo pela
Tua justiça, quero ser declarado justo pela Tua justiça”. Assim encontraremos
salvação.
Para finalizar
temos de ver o v. 21: “Quanto a mim, esta
é a minha aliança com eles, diz o Senhor; o meu Espírito, que está sobre ti, e
as minhas palavras, que pus na tua boca, não se apartarão dela, nem de teus filhos,
nem da dos filhos de teus filhos, não se apartarão desde agora e para todo o
sempre, diz o Senhor”.
Sabe qual é a
nossa esperança? Sabe por que podemos nos prender a este texto? Porque ele
termina dizendo: “...diz o Senhor”. Se Ele diz, vai
acontecer e acontece. Ninguém pode se interpor entre o que Ele diz e o que
fará.
Em Isaías 46:11
Ele diz: “Eu o disse, eu também o
cumprirei; tomei este propósito, também o executarei”. Eu fiz um plano e o
executarei. Podemos nos agarrar a estas verdades sabendo que vamos até o fim,
porque aquele que nos deu a salvação a susterá, a manterá. E ao que não O
conhece ainda, o caminho é o da súplica, do rogo, do clamor. Ponha o rosto no
pó e peça que Deus tenha compaixão e que o Espírito do Senhor possa convencê-lo
do seu pecado e fazê-lo vir a Ele suplicando por piedade porque é um perdido
pecador.
Faça isso e verá
a glória de Deus.
Amém!